segunda-feira, maio 12, 2008

Biocombustíveis: texto interessante

Manos
li aqui no forum mozonline alguns debates interessantes sobre "os bio-combustíveis", não pude dar o meu palpite, estou em viagem e continuo com acesso restrito a internet. mas li uma apresentação do governador nigeriano do Rivers State, mas conhecida como a região do Niger delta, famosa pelos contornos da pobreza e da sua riqueza (o petróleo). o artigo do governador Chibuike Rotimi Amaechi, não toca precisamente a questão dos bio-combustíveis, mas mostra alguns pré-requisitos para uma discussão sobre:
1) que razões levam os nossos governantes e nossos países a “acomodarem-se” no papel de "fellow travellers" em relação a varias questoes de desenvolvimento.
Mas é preciso não perder de vista , durante a leitura do artigo, que Chibuike Amaechi é um político que fazendo uso das posições "imperfeitas" de alguns conceitos que alimentam o dicionário da indústria do desenvolvimento e neo-liberal tenta contrapor introduzindo realidades econômicas sem recorrer a exageros emocionais de que tanto estamos habituados. Em jeito de conclusão (indignação para o governador) o artigo mostra que as relações econômicas desiguais e impostas no mundo São um grande incentivo para a relutancia dos africanos em aceitar a democracia, os africanos votam para governos que não tem controlo nenhum sobre o futuro dos seus paises ( seria o mesmo que as reservas do nosso banco central fôssemos depositar no banco central da Somália).
2) seria inteligente se os nossos governantes discutissem mais sobre o acesso ao mercado global e o fim do protecionismo europeu e americano por forma a garantir a longo prazo o sucesso da agro indústria africana, e porque não da indústria do "bio-combustível".
o açúcar , o trigo, e o feijão mocambicano não podem "entrar" no mercado europeu (as taxas São proibitivas e os subsidios protecionistas), mas sim o etanol, mas quem garante que o etanol vai ser a nossa porta de entrada para o mercado europeu? que garantias a europa e a América dão para a compra do bio-combustível africano?. mas aqui este artigo do governador nigeriano não pretende dar respostas a isso, mostra a importância das perguntas. “Se” com esta questão dos bio-combustíveis não estamos perante o "business as usual" onde os outros já dicidiram la no norte e nos aqui no sul só resta-nos fazer o second argument. A europa já resolveu grande parte da sua questão energética há muito tempo ( a Rússia com o putin foi a solução para isso). mocambique precisa entrar na corrida para a produção de bio-combustíveis mas deve ter cuidado com a ilusão "for growth" para a redução da pobreza. porque a china e Índia devido ao seu poder econômico e político já produzem também o "first argument", para continuarem com o crescimento que estao a ter precisam da africa, na forma mais bruta como fizeram os europeus desde o seculo 15, o caminho ja nao é para as indias, é para africa.
3) no nosso caso parece que já estamos a ser vitimas do "capital especulativo", os que já tem licenças para comecarem a produzir os famosos "bio-combustíveis" escolheram as terras mais "ricas" a preço de banana, não tem know-how e muito menos capital, então o que interessa parece ser vender a licença para terceiros (aqueles com capital e know how) e fazer um galharda de dinheiro).
o mesmo aconteceu com as privatizacoes nos famosos anos da reestruturação econômica, onde as empresas foram "assaltadas" por especuladores sem conhecimento e capital para a revitaliza-las.
4) a experiência da Índia e outros países da Ásia,mostra que a revolução verde faz uso excessivo de pesticidas e sementes geneticamente modificadas, e hoje fala-se do cansaço da terra devido ao seu uso intensivo e "industrial", de graves problemas de saúde afecta os trabalhadores agrícolas e a contaminação dos rios, a longo prazo vamos assistir uma catástrofe ambiental aliada a fome.
E a nossa revolução verde com este andar vai estar de mãos dadas com a produção dos bio-combustíveis? e ninguém hoje consegue dizer como será feito este casamento sem por em causa o meio ambiente e a segurança alimentar, e nem como queremos proteger o uso indiscriminado deste recurso precioso que é a terra (e não venham com esta estória de que mocambique tem terra bastante, porque com a floresta foi o mesmo discurso em mocambique, costa de marfim, Nicarágua, e hoje estamos a perguntar como foi possível?).
5) as manifestações contra o custo de vida nas capitais africanas e não só, mostram a fragilidade que os mercados africanos tem perante o capital especulativo, mostra também que se o preço do petroleo sobe, o preço de produtos básicos e de pesticidas também vai subir, o que devia ser normal,
mas é preciso saber que o "capital" funciona na base de lucro imediato enquanto que a terra precisa de tempo. alguns analistas da praça escreveram que a crise americana ( a fraqueza do "dólar") não vai tocar o nosso mercado, eu acho que falharam na analise, não sou economista, mas a experiência como o "capital especulativo" funciona bem em maputo (o exemplo mais interessante tem sido preço do arrendamento de casas) e a característica da nossa classe empresarial, mostra como enganaram-se.
6) não estou a ser negativista como dizem os outros. quem "virou" negativista foi o mundo: as cidades africanas cresceram, mais gente com idade produtiva emigra para as cidades e vive no meio urbano que nao oferece emprego a todos. o campo ficou para os mais “velhos” que não tem energia e conhecimento para "lidar" com a zanga da natureza: cheias, secas, erosão, a exploração desenfreada da madeira, e os famosos conflitos de terra entre o pequeno camponês e a agro-indústria/bio-combustíveis (aqui perto na manhica,magude, matutuine e xinavane um bom laboratório para ver isso). as mudanças climáticas mostram que o continente africano e a zona sul de Ásia vão perder 20% de produção agrícola devido a mudanças climáticas nos próximo tempos.
7) agora é preciso saber que a fome sempre existiu desde a civilização humana, hoje com o avanço tecnológico e a riqueza “deste adorado mundo moderno” torna-se inaceitável ver a fome como uma coisa "natural e moderna", o mundo nunca conseguiu produzir comida para toda gente e com este ritmo de crescimento populacional torna-se mais difícil falar do fim da fome tão já. Mocambique já fez muito, há 15 anos atrás mocambicanos andavam vestidos de trapos e morrendo de fome, mesmo a 250 km de maputo. seria bom, se eu conseguisse convencer alguns mocambicanos de que o nosso pais precisa é de acabar com a fome em mocambique e não acabar com a fome do mundo, porque para isso teríamos que vender todo o mocambique.
8) alguns dizem que devido as manifestações provocadas pelos chapas (o aumento constante do preço do combustível), estamos perante uma crise energética numa dimensão mocambicana, pode ser verdade. o governo já tinha começado bem com a questão de cahora bassa, o gás de pande e a refinaria em nacala, agora com esta de bio-combustíveis como fazendo parte da estratégia para a criação da reserva energética parece-me muito problemática, pelo menos para leigos como eu.

la famba bicha
Jorge Matine

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1 comentário:

Aline disse...

Excelente artigo! Realista e consciente! A produção dos bio-combustíveis não pode realmente ser tratada levianamente como tem sido pela maioria dos governos. Em primeiro lugar, o povo tem de ser alimentado!

Parabéns!