quarta-feira, dezembro 10, 2008

A PROBLEMÁTICA POLÍTICA MUNDIAL VISTA À LUZ DA CRISE ZIMBABWEANA

A PROBLEMÁTICA POLÍTICA MUNDIAL VISTA À LUZ DA CRISE ZIMBABWEANA

´´A propaganda leva-nos muitas vezes a abraçar

agendas ou causas ruíns, que só servem os interes-

ses dos outros países, mas que nunca devíamos assumir,

em total prejuízo daquelas que são nossas, e que devíam

servir os nossos genuínos interesses´´ Professor Baguenda.

Por Gustavo Mavie

Um dos meus professores que mais me marcou, um tanzaniano de nome Baguenda, que me deu a cadeira de ´Pensamento Político´´, várias vezes proferia estas palavras com que começo este artigo com que pretendo dissertar sobre a realidade política mundial de ontem e de hoje, tendo como epicentro, a crise político-económica zimbabweana.

Ele insistia sempre com a calma que lhe era característica, que a propaganda visa moldar as mentes das pessoas a que é dirigida, para que pensem em função e conformidade com o desejo do propagandista.

Para melhor se fazer entender, ele recorria muitas vezes, como que inspirando-se em Jesus Cristo, a parábolas, como quando dizia que a propaganda visa levar os seus alvos, a dançarem ao som da música do propagandista.

Por isso, Baguenda instava-nos sempre, a compenetrarmos, e a pensar profundamente sobre porque é que somente os líderes dos povos do terceiro mundo, têm sido severamente punidos pelos pequenos e grandes erros ou desmandos que amiúde cometem no processo da governação dos seus países.

Um dos seus exemplos predilectos, era o então presidente Noriega da Nicarágua, do Panamá, que os Estados Unidos foram prender na década de 80 no seu próprio pais, em pleno exercício do seu mandato, e o levaram à força para uma prisão norte-americana, onde até hoje se encontra a cumprir uma pena perpétua, após o condenarem sumariamente, sem direito a desfesa, por alegado tráfico de drogas.

Julgo que hoje Baguenda deve recorrer a Saddam Hussein, para mostrar que os EUA continuam iguais a si próprias, e a penalizar os estadistas de outros países, recorrendo a todo o tipo de acusações, como quando derrubaram este líder iraquiano, sob a alegação de que detinha armas de destruição massiva, ao mesmo tempo que têm estado a fazer tudo para penalizar Mugabe, a quem Washington e Londres acusam de ter cometido graves violações dos direitos humanos no seu país, quando eles próprios são piores violadores dentro mas, acima de tudo, fora das suas fronteiras, como iremos demonstrar ao longo deste artigo.

Baguenda tinha, obviamente, um outro ror de muitos outros casos ou exemplos com que nos punha as nossas mentes em permanente ebulição e questionamento da tortuosidade da política mundial, para que não as deixássemos moldar pela propaganda ocidental, especialmente pelo duo EUA-UK, ou Grã-Bretanha neste último caso.

´´Protejam as vossas mentes da propaganda venenosa, e vocês próprios, com o saber que vos faça sempre sábios, e para isso, devem ler e ler sempre bons livros políticos, como este de Hans Morgenthau intitulado ´´A Política Entre Nações – A luta pelo Poder e Pela Paz´´., assim nos instava ele, para depois vincar que se não nos protegermos, seremos conduzidos como um rebanho que até se leva à morte no matadouro sem ter consciência disso ate que lá chegue se seja decapitado um a um.

Neste seu livro, Morgenthau destaca, no capítulo sobre propaganda, que qualquer país que seja, e muito mais quando é uma superpotência que queira manter a sua influência e assim perpetuar a sua dominação político-ideológica sobre o resto do Mundo, deverá servir-se não só do seu potencial diplomático e militar, mas, acima de tudo, deverá montar uma poderosa máquina de comunicação, como rádios e televisões, para com elas disseminar a sua propaganda, que lhe possa permitir moldar um pensamento uniforme, e assim poder manter a submissão (voluntária) dos outros povos´.

Morgenthau vinca que hoje em dia, ´´a política externa é feita não só através dos meios tradicionais da diplomacia e do mito militar, mas, também e acima de tudo, com base na nova arma que é a propaganda.

´´Isto porque na luta pelo poder no domínio internacional, não se pode limitar apenas às guerras militares pela conquista da supremacia militar, e pela dominação política, mas tem que ter sempre em conta a luta pela conquista das mentes dos homens´´, vinca este académico já falecido norte-americano de origem alemã.

´´O poder duma nação, agora, depende não só da habilidade da sua diplomacia e da força das suas forças armadas, mas também pela sua capacidade de atrair as outras nações e povos, a abraçarem a sua filosofia política, bem como tudo que são o seu espólio político e suas instituições em geral´´, assim destaca Morgenthau.

Esta sua explicação, explica também de forma clara porque é que os países com intenções ou tendência de dominar política e militarmente outros povos, como os EUA e Grã_Bretanha, gastam rios de dinheiro para montar e manter poderosíssimas rádios e televisões nos seus países, sendo com base nelas que se servem para disseminar essa sua propaganda, como são os casos da Voz da América e da BBC. Montaram e mantêm tais meios de comunicação poderosos, para com elas moldarem as mentes dos homens de todo o mundo, para que pensem como eles querem que pensem.

Muito embora não seja para dominar outros povos, a China por exemplo, serve-se também dos seus meios de comunicação de massa, como escudo de defesa das mentes do seu povo, para armá-lo, de modo que a mente deste não seja assaltada pela propaganda estrangeira ou seja moldada pela do Ocidente, e que neste caso tem estado a tentar a levar os cidadãos chineses a acreditarem que o seu governo comunista é ruim, que deve ser substituído por todos os meios.

Para tal, o governo chinês gasta também o equivalente a biliões de dólares para montar uma poderosa máquina de comunicação, como mega estações de rádio e televisão.

Para se ver a importância que a liderança chinesa atribui aos seus media, é que os coloca em pé de igualdade com o exército. Os seus dirigentes justificam isto, dizendo que quando um governo não se arma com o poder dos meios de comunicação para manter o seu povo bem informado da verdade e da justeza da sua agenda político-económica nacional, arrisca-se a fracassar, e a ver todo esse projecto ir-se por água abaixo, porque a mente desse seu povo será moldada à imagem e semelhança do que o Ocidente quer seja, e será levado a pensar em função do que beber da propaganda que lhe será emitida de fora.

Tal pode acontecer de facto, porque Morgenthau vinca que ´´toda a política externa é uma guerra pelo controlo das mentes´´; e que, ´´no caso concreto da propaganda, é tanto assim em específico, porque visa mesmo moldar directamente as mentes das pessoas, para que aceitem certos factos forjados, não porque são verdadeiros, mas porque assim se lhes são apresentados ou inculcados´´, sendo o exemplo disto agora, o facto dos EUA terem espelhado ao mundo a tese que no Iraque de Saddam Huseein, havia armas de destruição massiva, que deviam ser destruídas a todo o custo, porque caso contrário, poderiam ser usadas para destruir os próprios EUA e o resto do Mundo.

A força com que espelharam essa mensagem, levou os menos informados da táctica da Casa Branca executada pelo Pentágono, a acreditarem que tais armas existiam mesmo, quando, na verdade, era um trampolim que visava encobrir o que estava em causa de facto, que era o petróleo iraquiano que Saddam não deixava ser assaltado pelos EUA a preço de banana.

MBEKI SUGERE QUE TSIVANGIRAI TEM A MENTE FORMATA PELO OCIDENTE

É interessante que o antigo Presidente sul-africano, Thabo Mbeki assume como válida esta tese de Mergenthau, ao deixar claro que o que tem complicado e retardado a entrada em funções do governo de partilha do poder no Zimbabwe, é porque o próprio líder da oposição zimbabweana Morgan Tsivangirai, pensa e age em função do que lhe é ditado pelos lideres ocidentais, alertando-o, numa carta que lhe endereçou o mês passado, que isso não lhe vai ajudar em nada para a normalização da situação no seu país.

Nessa carta, Mbeki desmonta a falácia dos dirigentes do MDC e suas alegações, ao mesmo tempo que vai mais a fundo, para expor a tendência dos seus lideres de levarem à imprensa ou à arena pública tudo o que discutem em fóruns diplomáticos da região, bem como a sua evidente submissão e clientelismo ao Ocidente, em prejuízo dos legítimos interesses deles próprios e dos zimbabweanos em geral.

Mbeki vinca assim: ´´ Sabe muito bem que, entre outras coisas, vários países da nossa região albergam numerosos refugiados económicos vindos do Zimbabwe, e que tem imposto um fardo muito pesado sobres estes nossos países´´.

Noutro passo, Mbeki vinca assim: Sabe também que por lealdade à prática da solidariedade africana, nenhum destes países e governos tem estado a falar publicamente do quanto custa suportar esse fardo, por recear de que isso podia despoletar xenofobias de que todos nós somos contra. No entanto, os lideres do povo do Zimbabwe, incluindo você meu querido irmão, precisam ter sempre em mente que a dor que o vosso país suporta, é transferida para as massas dos nossos países, que neste caso se confrontam elas próprias com os desafios que derivam da pobreza em que vegetam, para além de que muitos deles enfrentam o desemprego e o subdesenvolvimento´´.

Ele destaca que ´´há que ter em conta também que este fardo não é carregado pelos países da Europa Ocidental ou da América do Norte, e que, neste caso, são quem beneficiam das habilidades dos profissionais zimbabweanos que emigram nesses seus países´´.

´´Ao fim e ao cabo, quando tudo tiver sido dito e feito, o Zimbabwe terá de existir em paz e colaboração produtiva com os seus vizinhos na Africa Austral e no resto da Africa. Realisticamente, o Zimbabwe nunca partilhará a vizinhança com os países ocidentais europeus ou da América do Norte, e, por conseguinte, assegurar o seu sucesso na base da sua amizade com estes países distantes, e persistir na sua recusa às decisões dos seus vizinhos imediatos.´´, assim diz Mbeki, na sua réplica à uma carta que o Secretário-Geral do MDC, o emocional e fervoroso Tendai Biti, lhe endereçou, em que acusa Mbeki e os restantes líderes da SADC, de serem combardes, ao mesmo tempo que rotula a decisão que estes tomaram na sua última cimeira na Africa do Sul, de que o MDC deve partilhar com o governo de Mugabe a gestão do ministério do interior que controla a polícia, de ´´inútil´´.

Mbeki repudia veementemente o recurso a uma linguagem irresponsável e insultuosa com que Biti e, dum modo geral, todos os lideres do MDC Tsivangirai, tratam os lideres da região. Sempre que se dirigem a eles, espelham de facto um desprezo e uma veneração e um amor mortal pelos do ocidente, talvez porque é deles que recebem todos os apoios financeiros e ordens para decidir o que fazer a cada vez que vão á mesa de negociações com o executivo de Mugabe.

PENSEM SOBRE PORQUE É QUE OS LÍDERES OCIDENTAIS E SEUS PAÍSES NUNCA SÃO SUJEITOS A SANÇÕES OU BANIMENTOS

Baguenda instava-nos também a pensar sobre porque é que as sanções políticas e económicas, são sempre e somente impostas aos líderes e países do terceiro mundo, do tipo das que são agora aplicadas contra o Zimababwe e a sua liderança pelo Ocidente, e que têm sido a principal causa do sofrimento e morte de seus cidadãos por doenças evitáveis, como os centos que ja sucumbiram agora vítimas da cólera, ou bloqueios económicos, como o que tem estado a ser imposto contra Cuba há mais de 50 anos pelos EUA, mas que nunca são aplicadas a estes mesmos países ocidentais que passam a vida a punir os outros, mesmo quando cometem os piores crimes contra os seus próprios povos ou contra os dos outros países e de toda a humanidade como tal.

Para nos levar a ver no concreto aquilo de que estava pregando, enumerava uma série de guerras e invasões injustificadas que estes países haviam levado a cabo ao longo de séculos contra outros países e territórios que não gostavam delas ou que não eram aliados seus do tipo Israel que têm estado a defender, não obstante esteja a ocupar a Palestina e a matar o seu povo há mais de 60 anos, bem como uma infinidade de outros actos bárbaros que haviam cometido então em nome da luta contra o comunismo que eles diziam que era ruim para a humanidade. Entre o ror de barbaridades que ele apontava, destacava a colonização que impuseram sobre o resto do mundo, para não falar da invasão e ocupação do Vietname que, neste caso, foi primeiro levada a cabo pela Franca e depois pelos EUA.

´`Pensem sobre isto e muito mais, e vejam quão hipócritas são estes países, que se armam em defensores acérrimos dos direitos humanos, como o têm proclamado, quando durante séculos discriminaram oficialmente nos seus próprios países, os negros, como aconteceu nos EUA ou na Africa do Sul dos bóeres, com a cumplicidade de quase todo o mesmo Ocidente, do mesmo modo que os EUA quase exterminavam com balas de todo o tipo, os índios, para não falar das graves violações dos direitos humanos que cometeram além fronteiras, como o fazem agora no Vietname´´., assim dizia.

Antes de terminar este artigo, devo destacar que o que voltou a recordar-me que a propaganda perverte as mentes e decidir escrever este artigo, foi a procissão de cidadãos moçambicanos que condenaram Mugabe durante o Café da Manhã desta segunda-feira última na RM. Foi espantoso mas compreensível ver que há pessoas que acreditam que o Ocidente morre de amores pelo povo zimbabweano, e que tudo o que tem feito visa salvá-lo do diabólico Mugabe.

É certo e inegável que Mugabe cometeu alguns excessos, mas estão bem longe se igualar aos cometidos por Bush, Blair e companhia que neste caso lideram a campanha anti-mugabismo. E os que acreditam que eles morrem de amores pelos zimbabweanos, sofrem de amnésia. Isto porque passam apenas 16 anos que este mesmo Ocidente que hoje quer Mugabe deslojado do poder, apoiava lideres muito mais sanguinários como Ian Smith e os Bothas que estavam á frente dos regimes racistas que nos discriminavam, matavam e mantinham santos na terra como Mandela na cadeia, um Mandela que só este ano foi, finalmente, retirado da lista negra em que os EUA mantêm todos os que consideram como lideres terroristas.

Confesso que sabia que o Ocidente estava ganhando a guerra das mentes em função da sua propaganda em torno desta crise, mas nunca imaginei que havia tanta gente assim que para mim já têm as suas mentes já formatadas, e que já nutrem tanta repulsa por Mugabe e o seu governo. É curioso que na mesma segunda-feira, jà à noite, houve na BBC um outro debate, em que esta emissora pretendia saber se haveria ou não consenso de que se deve recorrer à força para se remover Mugabe do poder.

A intensidade e divergência de opiniões com que esse debate decorreu, levou-me a ver que o que havia se realizado no Café da Manha servido pelo Emílio Manhique serviu tinha sido um kuxakanema ou ensaio.

Uma das coisas que retive desta da BBC, foi quando um dos participantes de nacionalidade ganesa, se insurgiu contra um outro da coroa britânica que preconizava que se devia levar Mugabe ao julgamento em Haia, por crimes contra o povo zimbabweano.

O ganês chamou ao atenção o tal britânico, dizendo que se se fosse pelo gravidade dos crimes cometidos, os que deviam ser priorizados eram George Bush, dos EUA, e o seu amigo e fiel britânico Tony Blair, porque invadiram, sem justa causa, o Iraque na base de mentiras, e a mantêm ocupado, e a matar to seu povo só e só porque é contra essa sua ocupação. ´

´´Mas porque só levam para julgamento os lideres doutros países, e nunca os dos vossos próprios que, neste caso, também cometem crimes contra os povos, como o fizeram Bush e Blair, e ainda o fazem no Iraque´´, indagou aquele ganês, deixando o tal comentador inglês sem jeito, tendo este se limitado a dizer que ele tinha sido contra a invasão do Iraque, ao que o ganês replicou que agora devia exigir que fossem julgados, e não se limite a preconizar isso em relação a Mugabe.

Uma vez chegado aqui, julgo ter sido capaz de provar que há muita gente aqui no nosso país que tem a sua mente moldada pela propaganda ocidental, daí que se senta tanta repulsa contra Mugabe, por ter cometido quanto a mim, o pior crime de acabar com o monopólio das terras férteis pela minoria branca do seu pais, mas já não nutram nenhuma aversão e repulsa por Bush e Blair, que invadiram uma nação tão distante como o Iraque, para se apoderarem das suas imensas jazidas de petróleo.

gustavomavie@gmail.com


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