segunda-feira, fevereiro 23, 2009

Ainda sobre a reforma curricular na UEM

por: José Jaime Macuane


Caríssimos,

Antes de mais nada queria dizer que discordo da ideia de se rotular este processo de "redução da Duração dos Cursos".

Como docente da UEM e professor Universitário, chocam-me algumas coisas em relação a este processo de reforma curricular, principalmente devido a dois aspectos: o autoritarismo com que o assunto está a ser tratado; e a inconsistência do processo em si. Explico-me.

Sobre o autoritarismo já está claro nas frases que são trocadas entre as partes envolvidas. Mas chocou-me particularmente uma coisa: quando ouvi a RM dizer que o Prof. Firmino Mucavele foi a público esclarecer sobre o processo para se contrapor à desinformação (não sei se estas palavras são da sua autoria, apenas reproduzo a locução da RM) que está a haver em torno do assunto. Chamar de desinformação a discussão de um assunto, que por si é sensível e polémico (mesmo na Europa que começou há mais de dez anos e ainda hoje se debate o mesmo com fervor e sem "vencedores" ou "donos da verdade"), e a exposição de pontos de vista diferentes de um problema, é no mínimo mau gosto; para não dizer falta de argumentos. Afinal, qual é o problema de se discutir de forma mais ampla e aberta este assunto? Na Europa ainda hoje se discute Bolonha e se aponta sequelas. Ainda há duas semanas estive com um colega europeu que está prestes a fazer o doutoramento e disse que preferia fazer do antigo curriculum, porque tem dúvidas sobre os novos currícula. Será apenas conservadorismo, aviso de mau tempo, ou receios (in)fundados? Afinal, porquê temos que ser mais papistas que o Papa? Porquê simplesmente não estarmos abertos a outros pontos de vista. Neste momento o mundo está a questionar o dogma da eficiência do mercado desregulado e livre, que há poucos meses era quase intocável. Quem nos garante que não estaremos outra vez na canoa errada?

Tenho particularmente acompanhado o assunto e acho que ambos os lados têm pontos válidos a apresentar e não adianta se insistir que a reforma deve caminhar assim mesmo, numa só direcção, porque há problemas óbvios que devem ser resolvidos, se queremos de facto ter um ensino de qualidade.

Na verdade isso é sintoma de algo mais grave: a falta de discussão das políticas de ensino no País nos últimos tempos, que pelos vistos tem tido resultados desastrosos, gastos desnecessários de recursos e outros problemas. É só vermos quanto gastamos com correcção automática dos exames e com os exames externos (que acho que devem continuar a existir), com um retorno baixíssimo. Há recursos que claramente estão a ser claramente mal gastos na educação.

E isso nos leva à tal inconsistência a que me referi. Há menos de 3 anos introduzimos as licenciaturas de 4 anos; algumas delas nem têm 2 anos de funcionamento. Alguém me pode explicar, se a Declaração de Bolonha é de 1999 (o processo já havia sido informalmente iniciado em 1998), porquê gastamos recursos a reduzir as licenciaturas de 5 para 4 anos ao invés de entrarmos logo no Processo de Bolonha? Ou será que ainda não sabíamos da sua existência? Como é que este processo se liga ao ensino básico e médio que está claramente a perder qualidade?

Há muito a discutir nesta reforma curricular e não adianta recorrer à rotulação dos que apresentam pontos divergentes, porque as decisões que estamos a tomar hoje afectarão consideravelmente as perspectivas de desenvolvimento do nosso país. Recusar o debate, é falta de patriotismo. Por isso, vamos ao debate, sem receios nem intimidações e sem nos apresentarmos como detentores da verdade.

Mas devo fazer uma concessão e dar uma particular razão aos que são contra esse debate, se os que reagem preferem se esconder sobre o rótulo "um grupo de docentes da UEM" (se são identificáveis, as minhas sinceras desculpas), ao invés de exporem os assuntos com frontalidade, talvez devamos mesmo deixar que os que estão à frente da reforma nos impinjam a sua visão do mundo e penhorem o nosso futuro e dos nossos filhos. Afinal, com essa postura merecemos isso.

Um abraço a todos


JJMacuane



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